Livre de filhos
O objetivo deste texto é refletir sobre os casais que não desejam ter filhos. Tal é a nossa situação, entre os muitos "quadradinhos" que criamos para tentar classificar as pessoas, definindo-as superficial e precipitadamente, nós não nos "encaixamos" no padrão de família margarina (casal com filhos e cachorro).
Somos um casal sem filhos por opção. Isso quer dizer que o fato de não termos um filho não é motivado por uma incapacidade reprodutiva (é bem verdade que não tivemos nunca o interesse de verificar se teríamos algum tipo de esterilidade). A decisão foi resultado de um conjunto de fatores, analisados e discutidos muitas vezes.
O fator econômico: ter um filho pode custar pouco ou ser muito caro, dependendo das experiências que se deseje proporcionar a ele (tais como boas escolas, plano de saúde, aulas de idiomas, intercâmbios, viagens, universidade), mas sempre tem um impacto importante no orçamento, alguns economistas calculam que as despesas aumentem entre 20% e 30% com a chegada de um rebento.
Nosso pessimismo em relação à humanidade também foi considerado. Se vemos o mundo como um local hostil e se não acreditamos que possa se tornar melhor, não há muito sentido em procriar. Ainda que nosso filho pudesse ser educado para ser um homem de bem, trazê-lo para uma sociedade que consideramos sem esperança não nos parece sensato nem justo.
Também não estamos dispostos a alterar nossa rotina por causa de um filho. Se tivéssemos optado por sermos pais, a paternidade e a maternidade seriam assumidas e não terceirizadas - como, por causa da nova configuração do trabalho e da carência de políticas de apoio à maternidade e à paternidade em nosso país e por vezes por falta de interesse dos pais em serem verdadeiramente pais, têm ocorrido em muitos casos, com creches, babás e parentes tendo mais influência nos valores transmitidos às crianças.
Educar uma criança, com amor, carinho, mas também com o objetivo de que a mesma viva em sociedade, respeitando os demais, cultivando valores como justiça, honestidade, lealdade, entre outros, tudo isso dá muito trabalho. Exige dedicação e esforço contínuos por parte dos pais e não estamos dispostos a empreender essa tarefa.
Mas talvez o motivo mais importante para nossa escolha é porque somos felizes.
Entendemos que poderíamos ser felizes com um filho, mas não temos interesse em experimentá-lo.
Já nos sentimos muito bem assim como somos, casal livre de filhos. O amor que nutrimos um pelo outro nos é suficiente, com ele somos o dobro.
Não nos sentimos incompletos em questões de amor (porque fragmentados todos somos, com ou sem filhos, solteiros ou não).
Entendemos que a decisão de ter ou não ter filho(s) é assunto de foro íntimo, diz respeito somente ao casal. No entanto, por conta da dificuldade por parte de algumas pessoas, familiares sobretudo, em respeitar ou compreender nossa escolha, resolvemos tornar público um pouco de nosso pensamento sobre ter filhos.
Todos possuímos genes egoístas que desejam permanecer mesmo depois de nos completarmos (na morte), mas nós decidimos, racionalmente, que nosso ciclo terminará quando nos findarmos, poeira cósmica novamente.
E talvez ao final tenhamos a grata surpresa de sairmos da vida, tal como Brás Cubas, com um pequeno saldo: "- Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria".
PS: este texto não pretende ofender aqueles que desejam ter filhos. Liberdade é o nosso objetivo: liberdade para não ter filhos; do mesmo modo, se você tem ou deseja ter filhos, isso é uma escolha sua, mas que não precisa ser a do outro. E entendemos que amor pode ser também, com Camões, "querer estar preso por vontade".
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